26 setembro 2006
José Régio




"Vem por aqui" - dizem-me alguns com os olhos doces
Estendendo-me os braços, e seguros
De que seria bom que eu os ouvisse
Quando me dizem: "vem por aqui!"
Eu olho-os com olhos lassos,
(Há, nos olhos meus, ironias e cansaços)
E cruzo os braços,
E nunca vou por ali...

(...)
Não, não vou por aí! Só vou por onde
Me levam meus próprios passos...
(...)
Se ao que busco saber nenhum de vós responde
Por que me repetis: "vem por aqui!"?
(...)
Se vim ao mundo, foi
Só para desflorar florestas virgens,
E desenhar meus próprios pés na areia inexplorada!
(...)
Corre, nas vossas veias, sangue velho dos avós,
E vós amais o que é fácil!
Eu amo o Longe e a Miragem,
Amo os abismos, as torrentes, os desertos...
(...)
Ah, que ninguém me dê piedosas intenções!
Ninguém me peça definições!
Ninguém me diga: "vem por aqui"!
A minha vida é um vendaval que se soltou.
É uma onda que se levantou.
É um átomo a mais que se animou...
Não sei por onde vou,
Não sei para onde vou - Sei que não vou por aí!"

(Cântico Negro)